Apple: a Maçã apodreceu?

Perfis de liderança: o caso da Apple

Nesse artigo vamos analisar perfis clássicos de liderança, fugindo dos modelos atuais de autoajuda empresarial. Nos anos 60, Antony Jay, um dos mais brilhantes pensadores da gestão moderna, descreveu 3 tipos de gestores: Iode, Comissário e Híbrido.

O Gestor Iode

O Iode é um profissional altamente criativo. Sua capacidade de criar é muito acima da média. Porém, não se trata de um executor de tarefas e sim um criador de tendências e modelos.

O Gestor Comissário

O Comissário é um gestor extremamente abnegado às tarefas e prazos, sendo um gestor capaz de produzir o objetivo fixado de forma pragmática e dentro de prazos. Sua visão de processos é ímpar. Porém, não se trata de um profissional criativo, longe disso.

O Gestor Híbrido

Esse é o perfil mais raro de gestor, sendo capaz de criar e executar tarefas de maneira extremamente competente.

Perceba que estamos tratando de 3 perfis de liderança, sendo dois rivais tradicionais: Iode e Comissário.

Iodes não respeitam outros gestores sem capacidade criativa. Criatividade é fundamental para inovação, então Comissários são meros executores de suas ideias em sua visão.

Comissários são abnegados executores, sendo que seu respeito mais profundo está direcionado às pessoas que consigam cumprir prazos e métricas, pensar sobre números e tomar decisões bastante embasadas em fatos, não em pessoas visionárias.

O único perfil capaz de lidar com Iodes e Comissários ao mesmo tempo é o Gestor Híbrido. Este será respeitado pela sua visão, no caso de Iodes, e pela sua capacidade de gerenciamento de processos, pelos Comissários.

Vamos aplicar essa visão de Antony Jay à Apple.

Steve Jobs era o Gestor Híbrido. Sua visão criativa e sua capacidade de gerenciar a execução de seus projetos era ímpar. Se tornou um líder respeitado e temido pelo seu grau de exigência. Ele enxergava as possibilidades e exigia a execução das ideias, fossem suas ou de sua equipe de Iodes, sendo que não aceitava “não é possível” como resposta.

Tim Cook era o Comissário. Um dos executivos mais competentes do mundo, esse comissário possui uma capacidade de enxugar processos e desenvolver investimentos com a mais alta taxa de retorno possível.

Jony Ive era o Iode. Estudioso profundo de design, foi o responsável pela elegância e por proporcionar sensações únicas aos usuários de gadgets da Apple. As ideias criativas de Jobs e seus asseclas não seriam o sucesso retumbante que foram sem o trabalho de Ive, um dos maiores gênios do Design moderno.

Com a morte de Steve Jobs, Tim Cook, o Comissário, assumiu a gestão da empresa.

Seus números foram extremamente relevantes, alçando a Apple à um valor de mercado sem precedentes. Processos enxutos, direcionamento de recursos de acordo com a rentabilidade e uma estrutura de mix de produtos mais flexível e direcionada à demanda são suas marcas.

Mas, com esse novo conceito de gestão, a força da Apple se voltou a processos.

Perceba: Steve Jobs abominava aparelhos celulares que não pudessem ser utilizados com apenas uma mão, o que tornaria inviável hoje a linha Plus dos iPhones. A visão de inovação em primeiro lugar era sua doutrina de gestão, colocando equipes de design e projetos alinhadas para soluções de alto impacto em prazos e custos realistas.

Custava mais caro para a Apple o modelo de Jobs. Mas trazia mais inovação. Era a integração entre Iodes e Comissários. O valor percebido pelos consumidores nos produtos da Apple era amplamente superior. Tratava-se de uma empresa vanguardista.

A gestão do Comissário Tim Cook definiu novos patamares para a empresa, agora mais voltada a entrega de produtos confiáveis e rentabilidade. E isso criou um conflito interno com os Iodes da organização.

O que vemos no mercado atual são empresas chinesas ousando. Sempre temos a expectativa de que a Apple surpreenda o mercado, mas desde o momento em que Tim Cook assumiu a gestão da organização, nós não vimos nenhuma surpresa. Pode-se dizer, inclusive, que a Apple está se tornando reativa em relação aos seus concorrentes.

A insatisfação dos Iodes se revelou nessa semana. Jony Ive, o grande Iode, acaba de anunciar que deixará a organização e criará sua própria empresa. Será fornecedora da Apple, mas agora fornecerá também soluções de design para o mercado.

Qual a reação de Tim Cook? “Temos designers de excelência na Apple que assumirão as funções de Ive com maestria”. Será?

Um dos maiores capitais da Apple, o Iode criativo, está deixando a empresa. E será fornecedor de soluções para todo o mercado. Financeiramente e em uma visão de processos, na visão de comissário, trata-se de um bom negócio.

Mas abrir para a concorrência o talento do maior Iode do mercado mundial de design é um risco intolerável para qualquer gestor minimamente capaz de compreender a importância da criação e da experiência do usuário para uma organização.

Nos anos 60 Antony Jay já demonstrava a importância do equilíbrio entre Iodes e Comissários. E esse equilíbrio acabou na Apple, tendo seu ponto final de ruptura anunciado para 2020 com a saída definitiva de Ive.

Tire suas próprias conclusões: a maçã apodreceu?

Entender esse cenário vai ajudar na sua visão estratégica: Não seja o Tim Cook da sua empresa.

O autor é consultor da IDAti Consultoria e Treinamento

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